quarta-feira, 25 de setembro de 2013

para lembrar uma e outra vez

Ninho vazio. Já todas as mães ouviram a expressão. Umas já passaram pela experiência, outras ainda estarão um pouco longe dela, outras nem tanto assim. A expressão refere-se ao período após os filhos crescerem e saírem de casa.
Lembro-me de chorar quando o Samuel era ainda bebé, ao ver um episódio da série "Quem sai aos seus", em que o filho mais velho, Alex, saía de casa para ir para a faculdade. O Samuel era bebé e estava a dormir nos meus braços. Talvez as hormonas ainda não estivessem todas no seu devido lugar, mas o facto é que chorei e não foi pouco.
Ninho vazio. Às vezes esta realidade, que um dia certamente chegará, fica longe de nós, especialmente em dias mais caóticos.
Um bebé irritado devido aos dentes que estão a nascer, um xixi fora do alvo, crianças a brigar ou sem vontade de fazer os trabalhos de casa. Comida por fazer, casas viradas do avesso, roupa para lavar em escalada até à chaminé, casas de banho transformadas em piscina, marido que liga a avisar que chega mais tarde a casa. É então que gritamos, mesmo que para dentro: "Mas quando é que vocês crescem e agem como gente grande?" E eles farão isso.
- Meninos, vão brincar lá para fora, mas fechem a porta!- E eles vão fechar.
Arrumamos os quartos e descobrimos 1001 coisas pequeninas debaixo das camas. Pomos no lixo autocolantes e brindes partidos dos cereais, esticamos os lençóis da cama que parecem ter sido apanhados por um ciclone durante a noite, colocamos os brinquedos nas respectivas caixas, os livros nas prateleiras, os animais e carros nos devidos cestos. E dizemos em voz alta:
- Tentem manter o quarto arrumado até chegarem as visitas!- E assim será.
Preparamos um jantar delicioso com uma salada de agrião, um peixe cheio de especiarias e um bolo sem marcas de dedinhos na cobertura  e iremos come-lo sozinha ou a dois.
Pedimos privacidade quando estamos ao telefone, para realmente conseguirmos ouvir alguma coisa do outro lado da linha e nos concentrarmos na conversa.
- Nada de equipas de demolição, ringues de boxe, polícias e ladrões ou danças à minha volta, entenderam? Silêncio!- E vamos tê-lo.
Não haverá mais toalhas com pequenas nódoas de molho na mesa. Não precisaremos de proteger o sofá da sala com capas e não encontraremos surpresas nas cadeiras da cozinha. Não acharemos molas debaixo do sofá nem tropeçaremos em nenhum carrinho. Ninguém entornará a água ou o sumo durante a refeição nem haverá migalhas de bolacha pelo chão da casa nem papelinhos esquecidos com recadinhos ou desenhos. Não passaremos noites à beira de uma cama por causa de uma dificuldade em respirar, dor ou febre. Não encontraremos mais areia dentro dos ténis, nos bolsos dos calções ou até mesmo dentro da cama. Não teremos narizes ranhosos para limpar nem precisaremos de uma mala gigante onde guardar mil e uma dezenas de coisas e coisinhas. Não haverá papelinhos de rebuçados no carro nem a necessidade de perguntar "Já puseram o cinto?".
A voz não ficará mais rouca de tanto ler histórias nem a cara lambuçada de beijinhos peganhentos. Vamos apertar menos atacadores por dia, dar menos vezes copos de água e menos abraços. Todos os filmes estarão dentro das respectivas capas e não haverá um menino a cantar nem outro a chamar mamã vezes sem conta. Não mais nos levantaremos de noite para levar alguém à casa de banho nem para ter a certeza que estão mesmo tapados numa noite mais fria. Nada de reuniões de pais, nem treinos, nem jogos, nem festas de aniversário a cada fim-de-semana.
Imaginem só. Dormir a noite toda.  Conseguir ter uma conversa sem ninguém a puxar-nos a saia. Ver um filme do início ao fim. Estar na casa de banho sem ninguém nos bater à porta, várias vezes. Ter a roupa sempre limpa, sem nódoas. Comer um chocolate inteiro. Ter a fita cola sempre no lugar e as canetas tapadas, os sapatos alinhados na sapateira. Poder estar doente e descansar. Andar pelo quintal sem receio de levar uma bolada na tola ou ser atropelada por uma bicicleta.
Nada de risinhos no escuro do quarto, à noite. Nada de histórias mirabolantes nem beijinhos à chinês ou borboleta. Nada de joelhos para curar e desenhos colados no frigorífico. Nada de ensinar a ler e a escrever. Nada de plasticina colada ao chão. Nada de perguntas sobre Deus. Nada de abraços inesperados.
Só uma voz a gritar: Porque é que tu não cresces?
E o silêncio responde: Cresci!
 
[inspirado numa história que li há uns anos]

4 comentários:

sara f disse...

:,)
:,(

Avozinha disse...

Nós, que já estamos nessa fase há 11 anos, podemos dizer que há um certo alívio no ninho vazio... Às vezes queixamo-nos da falta de visitas ou telefonemas, mas logo surge a ocasião em que o barulho, os carrinhos, as migalhas surgem em pleno por mãozinhas mais pequenas do que as dos nossos filhos e... sabe bem saber que a responsabilidade agora não é nossa! Todas as fases da vida têm as suas oportunidades!

Rute Carla disse...

acredito que sim. todas as fases com as suas oportunidades e beleza própria.

um beijinho.

Ana Rute Oliveira Cavaco disse...

bem...