quinta-feira, 18 de fevereiro de 2010

{o regresso}

(Na semana passada, num dos dias em que visitei o meu pai no hospital, perdi-me um pouco pela baixa pombalina.)Hoje andei a pé por Lisboa, coisa que já não fazia há algum tempo. Cidade onde nasci e cresci, que aprendi a amar desde muito cedo.
Esta tarde achei a baixa pombalina muito diferente, deserta até, comparada com as pessoas que nela se cruzavam há uns anos atrás. Foi como estar a olhar a cidade com uns olhos totalmente novos, não reconhecendo muito do que via.
Em miúda passeava por ela às compras com a minha mãe e entrava em lojas como "O Balão". Com o meu pai ía aos bancos, à Papelaria Fernandes e comia um bolo numa pastelaria na rua do Ouro, que ainda existe. O meu irmão levava-me a ver filmes no S.Jorge ou no Condes e às Amoreiras, onde via gente da televisão, Levava-me a comer um prato de caracóis ou um prego no Palmeira e procurava os autocolantes que me faltavam para acabar as cadernetas do "Alf" e da "Batalha Final" ou um certo livro de "Os Cinco" em segunda mão nos alfarrabistas. Com a minha avó chegava até à Academia dos Amadores de Música e no caminho comprávamos lapiseiras e borrachas de cheiro e comiamos uma sandes no Terminal. No Inverno, nos dias de chuva, chegávamos sempre molhadas e a rir e a D. Laurinda, a senhora que sempre estava à entrada da Academia, sorria-nos. Com algumas colegas de escola, que moravam em bairros como Alfama e Castelo, conheci escadarias e zonas onde, de outra forma, dificilmente chegaria. Entendi então o que significava caminhar em passeios onde só cabia um pé (pequeno), enquanto nos tentávamos equilibrar levando com a roupa do estendal do vizinho na cabeça. Mas a cumplicidade com estes, os vizinhos, o bater muito próprio de cada largo e de um viver diário em conjunto foram-me apresentados.
Em miúda, dava milho aos pombos na Praça da Figueira (quando ainda não me tinha sido dito que eles contribuíam para a degradação dos monunmentos) e, na Rua Augusta, olhava com admiração o "homem estátua" e os cães que dançavam ao ritmo de uma cassete colocada num velho gravador. No Natal, percorria de carro as ruas com os meus pais e alguns amigos da igreja e olhava fascinada as árvores iluminadas da Av. da Liberdade. Quando era adolescente andava pelas ruas com um entusiasmo diferente. Gostava de caminhar entre pessoas e estilos vários, de reconhecer os cantos, locais, lojas e até as pessoas que nelas trabalhavam e sentir que estava na minha cidade, que a conhecia e que, de alguma forma ela me conhecia a mim. Tinha prazer em sentar-me em bancos na rua e escrever, de observar alguma personagem mais caricata e escrever sobre ela. De olhar o rio enquanto ouvia música e sonhava. Gostava de procurar uma determinada revista de música numa pequena livraria da Av. da Liberdade com a Nessa e livros e cd`s na Valentim de Carvalho. Admirar tatuagens numa certa estação de metro e o artesanato da Rua Augusta. Demorar-me a ver um desenho ou pintura a tomar forma ao som de um violino desafinado ou de um acordeão tocado por um rosto marcado, tão bem conhecido. Comer um gaufre quente na Rua Augusta, beber um batido na lua de mel, lanchar com a Shana numa pastelaria colada ao elevador de St. Justa, procurarmos por lojas específicas, irmos ao celeiro ou colecionarmos porta-chaves das inúmeras associações que nos abordavam pela Rua Augusta fora. As saídas com amigos, comer bolos quentes de madrugada numa fábrica no Gil e por aí fora. Mais tarde veio o trabalho.

Alguns cantos, lojas e cafés permanecem, outros, nem por isso. Os cyber-cafés e o restaurante Hard Rock chegaram.
Oh... e o entardecer na cidade? Os candeeeiros e as montras a iluminarem-se, anunciando o quase final de mais um dia... As pessoas a apressarem o passo para não perderem o barco ou autocarro de regresso a casa, as sombrinhas que se cruzam nos dias de chuva, o fado que soa na subida para o Chiado.

A cidade continua bonita, peculiar, com uma cara marcada pelo tempo, mas diferente. Pareceu-me ter outro ritmo e o anoitecer teve sem dúvida outro sabor. O entusiasmo que senti ao percorrer as suas ruas foi novo, até porque foi a primeira vez que o fiz com um termo do Starbucks na mão, saboreando um delicioso caramel macciatto.
Penso que a cidade mudou, sem dúvida. Mas é mais do que isso. Eu mudei.

3 comentários:

zarah disse...

:)
i miss lx

Anónimo disse...

I love Lisbon.
Já visitei algumas capitais europeias, mas amo a minha cidade, com as colinas, o rio, as belas fachadas dos prédios antigos. Tenho pena que esteja tão suja e degradada.
Paula

Anónimo disse...

Memórias bonitas de uma cidade mt bela e interessante... E belo texto!
Dina